quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

AMANHECEU


Ano passado, em 2009, a Missão IDE passou por um fim de semana muito diferente. Fomos convidados por um padre a visitar todas as casas do bairro onde era a sua paróquia, que ficava em uma das regiões mais carentes de Taubaté/SP, convidando o povo para participar de uma missa especial, cheia de música e orações avivadas naquela mesma noite. Nossa missão quando fôssemos visitar as famílias era verificar se todos eram batizados, se participavam de alguma igreja, orar pela casa e seus moradores e por fim fazer o convite para a missa logo mais à noite. Como o bairro era grande, visitamos metade das casas no sábado e a outra metade no domingo, sempre convidando para a celebração da noite.
Éramos cerca de vinte pessoas enviadas dois a dois para a missão naquele bairro. Ao final de cada período, quando voltávamos para almoçar ou para um café antes da missa ao final do dia, fazíamos uma partilha geral sobre o que encontramos. Visitamos muitas pessoas pobres, eu diria até miseráveis, que não possuiam nem comida em casa. Lembro da situação de uma senhora muito simples com seus três filhos pequenos e outro um pouco maior que a ajudava. Entramos na casa dela e não havia higiene alguma. Sua história era sofrida, falou muito de como foi injustiçada porque possuia uma casa própria que foi tomada assim que o marido morreu e agora ela estava naquele cortiço com seus quatro filhos esperando a justiça determinar a retomada da casa.
Me recordo de uma outra senhora de semblante muito triste, que ao saber que éramos católicos disse que era evangélica e agradecia nossa disposição mas não queria receber nossa oração. Ela fechou o portão e nós fomos em direção a próxima casa, mas enquanto andávamos decidimos voltar e insistimos em orar por aquela mulher triste. Imediatamente ela abriu o portão chorando e sentou-se no quintal da sua casa. Oramos pelo filho dela que há dias não aparecia em casa porque era viciado em cocaína e agora estava envolvido com o tráfico. A casa já não tinha mais TV, rádio, porta-retratos... A droga levou essas e outras coisas em troca do sustento do vício. A casa já não tinha mais paz, amor ou sonhos. A droga levou tudo.
Oramos por uma senhora em fase terminal de câncer que morava sozinha em uma casa de madeirite e lona. Rezamos por uma família marcada pelo adultério, em que o pai da família havia saído de casa para morar com outra mulher, a esposa abondonada estava imersa numa depressão profunda, a filha desse casal era mãe solteira e não suportando toda a pressão abandonou sua filha de sete anos com a avó e há tempos não dava notícia. A depressão daquela senhora a afastou do seu trabalho e o INSS ainda não havia aprovado o afastamento remunerado e todas as contas estavam atrasadas. A menina de sete anos chegou enquanto conversámos e viu a avó chorando. Ela se sentou ao lado da avó e chorou junto...
Houve quem visitou bares com pessoas bêbadas logo nas primeiras horas da manhã. Houve quem orou por prostitutas e travestis de um prostíbulo que havia na região. Naqueles dias todo aquele bairro foi visitado e a Missão IDE foi visitada por um Jesus que sofre, um Jesus que espera uma sentença justa do tribunal, um Cristo viciado e se afundando cada vez mais no vício, um Jesus desfigurado pela venda do seu corpo todas as noites em troca de algum dinheiro, Jesus doente, injustiçado, abandonado e sofrido.
Faltavam várias coisas na vida daquelas muitas pessoas que visitamos, mas uma coisa faltava de maneira generalizada em quase todas: a esperança. Sem a esperança, muitos dos moradores daquele bairro não conseguiam imaginar nenhuma possibilidade de mudança da situação, por mais remota que fosse. Tudo que possuiam era o seu abatimento e muitas vezes uma certeza de que aquela dor os acompanharia pra sempre. Tudo era noite.
A palavra de Deus diz quem pode com um espírito abatido? (Provérbios 18, 14) Sem esperança o futuro não possui horizonte. Mas ao contrário de tudo isso, a Bíblia também diz que a esperança não engana (Romanos 5, 5), e mais, um grito de esperança vem do Salmo 124, 4-6: Mudai, Senhor, a nossa sorte, como as torrentes nos desertos do sul. Os que semeiam entre lágrimas, recolherão com alegria. Na ida, caminham chorando, os que levam a semente a espargir. Na volta, virão com alegria, quando trouxerem os seus feixes.
Algumas obras sociais daquela cidade tentam atender aquele povo em suas necessidades de dignidade. Nossa missão naquele lugar, especificamente naquele fim de semana, foi reacender a luz do fim do túnel e mostrar que os sofrimentos da presente vida não se comparam à glória que virá. Que todo sofrimento permitido por Deus quer nos ensinar a viver melhor e na medida em que aprendermos, a esperança que cultivamos vai se tornando verdade e todo pranto é transformado em dança (Salmo 29, 12).
Depois daquele fim de semana minha visão mudou muito a respeito do Reino de Deus para os esquecidos da sociedade. O avivamento que tanto falamos aqui na Missão IDE só tem sentido se o Reino de Cristo for implantado em nossa geração, a começar pelos que mais sofrem, que são os prediletos de Deus. Com esse sentimento no coração e com toda essa visão, Deus me inspirou uma canção de esperança. Escrevi uma música que se chama Amanheceu e dá nome ao meu primeiro CD que será lançado no Aviva Brasil de 2011, no sábado do dia 15 de janeiro às 20h00. Maiores informações no site www.missaoide.com.br . Deixo aqui o meu convite para o lançamento do CD e a letra da canção que o Senhor quer colocar no coração dos aflitos desse mundo.

Amanheceu
No caminho de quem sofre sempre existe alguma dor
Só quem luta tem na alma alguma marca que ficou
Quando a estrada dessa vida está difícil de passar
E o horizonte bem distante já não dá pra enxergar
É preciso levantar os olhos para entender
Quando a noite esconde a luz, logo vai amanhecer

Pode o choro durar uma noite, mas a alegria vem com o sol da manhã
Todo aquele que já semeou com as lágrimas
Sorrindo colherá o bem que esperou
E o mundo então verá toda a virtude do Senhor
Que é capaz de dar ao homem sofredor, vitória

Sei que podes afastar esse cálice de mim
Retirando toda a dor que existe em meu viver
Eu espero em ti, Senhor, a noite escura vai passar
Seja feito o teu querer enquanto eu existir


Peço desculpas pela longa ausência daqui do blog, pra esse CD "Amanhecer" levou muito tempo e dedicação. Em breve mais novidades vão acompanhar esse CD.

Paz e fogo!
Um abraço,
Gil Monteiro

quarta-feira, 2 de junho de 2010

A criança que não cresceu

Todos nós já fomos crianças um dia. Algo que me faz bem é ver algumas fotos que “roubei” da minha mãe de quando eu e meu irmão éramos pequenos. Tudo isso me faz lembrar dos momentos bons. Das brincadeiras. Dos coleguinhas de escola. Dos aniversários. Uma foto memorável que tenho é uma que em estão faltando alguns dentes no meu sorriso. Boas lembranças! Mas essa fase não possui somente lembranças tão agradáveis. Minha mãe sempre lembra o quanto eu era uma criança birrenta e como eu gritava e chorava quando meus pais não davam algo que eu pedia. A infância também tem essas coisas... Birras por não ter o que se quer. Brigas com primos e amigos sem motivo algum. Sem contar a fase da mentira, quando as crianças vivem inventando as coisas. Não podemos esquecer também a fase em que a criançada sempre quer ser o centro das atenções, por exemplo no meio de uma conversa, sempre se intrometendo nos assuntos dos adultos... E assim vai! Inúmeras situações que quando vemos sempre dizemos: “coisas de criança!” Mas tudo isso são fases que vão sendo substituídas até que a criança amadureça e entre na fase adulta.
Algo interessante é notar que em alguns de nós sempre fica algum resquício dessas fases, e isso é perceptível em nossos círculos de relacionamento, seja na igreja, seja na faculdade, trabalho ou família. Você já deve ter passado por uma situação em que uma pessoa acima de qualquer suspeita, que você conhece, quando está sendo contrariada começa a gritar, às vezes agredir, apresentando reações inesperadas, verdadeiras birras. Ou então certos comportamentos do tipo carente demais, a síndrome do coitadinho, sempre se sentindo isolado e excluído de tudo e de todos, porque na verdade gostaria de ser o centro das atenções. E os famosos briguentos? Aqueles que “não levam desaforo pra casa”, que tem prazer em entrar numa briga, até mesmo sem motivo. Sem contar aquelas pessoas com quem convivemos e que tem o hábito de mentir sempre, em qualquer situação. E assim vai! Diversas situações que quando vemos, chegamos até a pensar: “isso parece coisa de criança!”
Em uma formação que tive recentemente lá na Missão IDE, fui confrontado com essa verdade, de que quando não tivemos uma infância bem resolvida, acabamos carregando as coisas de criança pra fase adulta. Muitas vezes quem está gritando dentro de uma pessoa que se descontrola quando é confrontada é aquela criança que aprendeu de maneira errada com os pais que pra conseguir qualquer coisa ela precisa gritar. Quase sempre quem vive se sentindo isolada e sem amor dos outros é a criança que não teve atenção suficiente dos pais na sua infância e tenta compensar depois que cresce em meio ao grupo de pessoas com quem convive.
Confesso que esse ensinamento que tive me confrontou em um dos meus pontos mais fracos, que é a necessidade de aprovação que tenho dentro de mim. E olhando minha história percebi que eu sempre fui daqueles que não se opõe, nunca diz não, que se preocupa demais com o que os outros vão pensar, que precisa da aprovação de todos para continuar. Sei que fui uma criança boa, um aluno exemplar, mas o que movia essas virtudes em mim? Estou descobrindo que era uma necessidade de aprovação diante da minha família e que tenho trazido até hoje. Isso revelou a criança mal resolvida que ficou no meu passado e que interfere até hoje nos meios onde me relaciono: pessoal, profissional e ministerial.
A palavra diz que Jesus crescia em estatura, em sabedoria e graça, diante de Deus e dos homens (Lucas 2, 52). Quantas vezes crescemos somente em estatura? Talvez você já tenha até freqüentado uma academia, que faz bem pro corpo, ajuda a crescer, mas somente em estatura. Corremos o risco de aparentarmos ser pessoas adultas, mas quando a vida nos colocar em alguma situação adversa, a criança lá dentro vai gritar, espernear, mentir, querer ser o centro... Paulo escreve aos Coríntios: quando eu era criança, falava como criança, pensava como criança, raciocinava como criança. Desde que me tornei homem, eliminei as coisas de criança (I Coríntios 13, 11). O mundo precisa cada vez mais de pessoas bem resolvidas e que deixam as coisas de criança para trás. O reino de Deus é feito de homens e mulheres que cresceram em sabedoria e graça, que sabem administrar adversidades, que lidam muito bem com conflitos. E fazem isso dentro de casa, nas escolas, nas fábricas, igrejas, ruas...
Nunca é tarde para esse crescimento. Vale a pena olhar pra nossa história, avaliar nosso comportamento do presente, pedir opinião dos amigos, se auto-analisar sem medo, e confrontando a realidade, que pode não ser muito boa, procurar ajuda e decidir crescer. Estou lendo um livro muito bom e que está me ajudando a ser melhor naquilo que ainda é difícil pra mim. Eu possuo amigos que estão me ajudando a ser melhor.
Tenho certeza que seremos mais úteis a Deus e à sociedade se formos adultos em estatura, sabedoria e graça. É hora de crescer!
Um abraço,
Gilberto Monteiro
Missão IDE

...quero deixar aqui também registrado meu pedido de desculpas pela demora nas postagens. Deus tem feito muita coisa em minha vida e esse tem sido um tempo de muitas boas novidades que tem tomado bastante tempo... Em breve essas novidades irão aparecer!

sábado, 24 de abril de 2010

POTENCIAL EM MOVIMENTO

Imagine uma pessoa bem no alto do prédio Mirante do Vale, o maior arranha-céu do Brasil, que fica no centro de São Paulo, com 170 metros de altura. Essa pessoa está segurando uma pedrinha bem pequena na mão. Quando ela olha lá de cima, as pessoas e os carros que passam em baixo parecem pontinhos que não se sabe ao certo o que são. A pedra na mão dessa pessoa, no momento em que ela está entrando no prédio, lá no térreo, não passa de uma simples pedra, é claro que se ela for atirada com força ela vai deixar de ser tão simples e inofensiva, mas o estrago que ela é capaz nessa situação não se compara ao que ela pode fazer se for lançada da cobertura desse prédio, a 170 metros de altura. No alto desse imponente edifício, uma pedrinha possui o potencial de uma bala de revólver! Isso é um fenômeno físico muito interessante, que envolve dois conceitos: a energia potencial e a energia cinética. Se alguém simplesmente soltar essa pedra de lá de cima, ela chegará ao chão com uma velocidade de aproximadamente 650 km/h, que é a velocidade de uma bala de revólver calibre 32. O estrago que a pedra e o tiro podem fazer são muito semelhantes nessas condições.

Existe uma maneira de calcular tudo isso, mas eu não vou me aprofundar, afinal esse não é um texto de física ou matemática, mas vale a pena entender o conceito: a medida que algum objeto vai aumentando sua altura, vai sendo elevado do chão, ele aumenta o que chamamos de energia potencial, e quando num dado momento ele é solto, quando é colocado em movimento, essa energia potencial vai se tornando a energia cinética. A pedra na mão de alguém no alto daquele prédio tem o potencial de uma bala de revólver, mas somente quando ela é deixada cair é que esse potencial vai se tornando realidade e no momento em que ela chega ao chão, a cinética, o movimento que ela tomou, faz com que toda potencialidade se transforme em realidade, causando os mesmos efeitos que uma bala de revólver.

Todo ser humano tem dentro de si algumas pedras, e no meio de todo mundo, no chão da vida onde as coisas acontecem, essas pedras parecem inofensivas, e mesmo quando lançadas com força não conseguem efeitos notáveis. É interessante porque às vezes as pedras que temos podem ser bem grandes, e quando as vemos pensamos: “essa pedra pode fazer um grande estrago!” Todos conhecemos alguém assim: aquela pessoa que tem uma voz incrível, que canta maravilhosamente bem, aquele fulano que prega de maneira excepcional, pessoas cheias de dons e capacidades paradas no térreo da vida, grandes potenciais que não “acontecem”, que não vão pra frente, ministérios que tem tudo pra dar certo mas só “dão errado”, pregadores e ministros cheios de unção e de capacidades mas que não conseguem “fazer muito estrago”. Nosso mundo está repleto de pessoas assim, cheias de dons e talentos, mas que permanecem plantadas no chão, atirando seus dons sem colher grandes efeitos. Aí podemos pensar: “então vamos subir o prédio pra lançar a pedra lá de cima”. Muitos tentam fazer isso, tentam alcançar os lugares altos, chegar ao céu, mas ao longo do caminho sempre existem janelas abertas, possibilidades mais rápidas e mais fáceis, e nos contentamos com as janelas do décimo ou vigésimo andar, afinal “estaremos mais altos do que os outros que estão lá em baixo e o efeito do que lançarmos será maior do que quando estávamos no térreo”. Pessoas assim, geralmente são aquelas que se acomodaram no lugar onde estão, ou pior, se acomodaram no jeito como são. Se aquilo que cremos e pregamos não modifica o que somos, teremos sempre um ministério estagnado em alguma janela no meio do prédio. Nossas canções e pregações terão seus efeitos, mas poderiam causar muito mais impacto em nossas próprias vidas e nas vidas de quem nos ouve. Se agimos assim, nosso potencial será menor e a nossa cinética também. Limitamos o conhecimento de Deus pela janela do meio, de forma mediana, de forma medíocre.

Todo bom potencial, por menor ou maior que seja, precisa chegar ao ponto mais alto do edifício. Mas mesmo estando lá em cima, tendo acesso ao Senhor, conhecendo sua Palavra, tendo comunhão com sua verdade, a pedra está presa em nossa mão! Experiências com Deus não são garantia de mudanças de vida. Uma aparente intimidade com o Senhor mostra um potencial ainda maior, mas potencial ainda não é atitude. O bom conteúdo de composições e pregações nem sempre revelam uma mão que deixou a pedra cair.... Às vezes é a misericórdia de Deus e a necessidade de um povo que move o braço do Senhor em benefício das pessoas, e não o tamanho do dom e a vida de determinada pessoa. Nos tempos de hoje, onde os fins justificam os meios, onde o jeitinho brasileiro é normal, a grande mão que segura as pedras que temos é a nossa falta de caráter. Depois que conhecemos a Deus, quando subimos no alto do prédio, corremos o risco de mudar nosso modo de vestir, nosso modo de falar, comer e beber, mudar nossas companhias, mudar tudo, menos o coração. Fazemos as coisas certas diante dos homens. Mas é quando estivermos sozinhos, quando ninguém puder nos ver ou descobrir, quando não houver possibilidade de reprovação de ninguém, aí é que temos a oportunidade de provar se temos caráter ou não, de escolher o certo simplesmente porque é certo, de mostrar a Deus que realmente fomos mudados de dentro pra fora, de que em nós habita carisma, mas acima de tudo habita caráter!

Um caráter íntegro é a mão que se abre no alto do prédio e deixa cair a pequena pedra. É nesse momento que toda a energia potencial guardada em uma canção, pregação, ou em uma simples oração entra em movimento e se torna energia cinética. E aquela mísera pedra quando alcança o chão deste mundo se torna a arma mais perigosa de que se tem notícia, porque não são carnais as armas com que lutamos. São poderosas, em Deus, capazes de arrasar fortificações (II Cor 10, 4).

O mundo está cheio de fortalezas, cheio de fortificações de violência, guerras, ódio, fome, miséria, corrupção, medo e indiferença... Quando os homens e mulheres de Deus se levantarem decididos a enfrentar o prédio mais alto e lá em cima revelar uma caráter sem máculas ao Senhor, então nosso mundo será bombardeado por canções, pregações e orações que não se restringirão às paredes das igrejas, mas que trarão nova vida à humanidade, invadindo nossas ruas, bairros, cidades e países. Ações que irão mudar as pessoas de dentro pra fora. Atitudes que terão como conseqüência a devolução da dignidade ao nosso povo. Gestos que colocarão líderes honestos em nossos governos. Haverá pão partilhado na igreja e também nas casas. Justiça e paz se abraçarão (Salmo 58, 11). Enfim poderemos ver o potencial se tornar realidade, enfim chegará até nós o Reino de Deus: POTENCIAL EM MOVIMENTO!

Um abraço,

Gilberto Monteiro
Missão IDE

Exclusivo para o Portal Católico